Por Emiliane Saraiva Neves
Diante de um espetacular pôr-do-sol, com
vista para a Baía de Todos-os-Santos com seus barcos e veleiros, a
Fundação Cultural Palmares lançou em Salvador no estado da Bahia, na
sexta-feira (21), os livros vencedores do Prêmio Oliveira Silveira. A
paisagem escolhida para o evento foi a mesma que inspirou muitos
escritores e que acumula diversas histórias desde seu descobrimento em
1501.
Sendo a segunda maior baía do mundo, com
mais de 50 ilhas, a Baía-de-Todos os Santos foi o cenário de batalhas,
como a Batalha de Pirajá (1823), quando a participação popular de
negros, índios e mestiços contribuiu para Independência da Bahia. Local
onde sua incrível beleza inspira poetas e cantores. Também é lembrança,
ainda bem vívida, da resistência e luta de africanos que vieram
escravizados para o nosso continente e com sua bravura e cultura,
construíram a identidade nacional.
Bahia é a terra de Custódia Wolney, nascida em Barreiras, autora do livro Sina Traçada – uma das cinco obras contempladas pelo edital – e também palco onde a história escrita por Eliana Cruz em Água de Barrela (romance que ficou em primeiro lugar no prêmio) acontece.
Sobre o lançamento dos livros, que
aconteceu no Centro de Cultura da Câmara Municipal de Salvador, Eliana
relatou que: “É uma emoção indescritível estar aqui nesse lugar, tão
próximo do Pelourinho, cenário do livro. Vários personagens transitaram
nessas ruas. Estiveram nesse elevador, subiram e desceram. Meu avô, um
dos personagens do livro, Mateus Cruz, foi quem renovou o maquinário do
Elevador Lacerda na década de 90. São marcos, lugares muito
emblemáticos. E o que vai ficar para sempre, para mim, desse lançamento é
que os descendentes dos personagens do livro, parentes que nunca se
viram, que só trocaram mensagens e se uniram em função da pesquisa do
livro, estão reunidos aqui hoje, pela primeira vez.”
Todos
que foram prestigiar o evento puderam levar exemplares dos livros e os
cinco autores ficaram à disposição para autografá-los. Os livros e seus
respectivos autores são: Eliana Alves dos Santos Cruz, com o livro Água de Barrela; Júlio César Farias de Andrade, com Haussá 1815 Comarca das Alagoas; André Luís Soares, com Sobre as vitórias que a história não conta; Maria Custódia Wolney de Oliveira, com Sina traçada; e Luiz Eduardo de Carvalho, com Sessenta e seis elos.
Custódia demonstrou “imenso prazer ao
vê-los ganhando asas” sendo lançados pelo país. Para ela, “livros têm o
poder de encantamento, tocam o coração das pessoas. E quando toca, as
transforma. E essa transformação contribui para um mundo melhor”.
Para Fabya dos Reis Santos, secretária
da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia
(Sepromi), que esteve presente, o evento se conecta com a Década
Internacional de Afrodescendentes, em que os eixos são reconhecimento,
justiça e desenvolvimento. Ela entende que os livros ajudam a consolidar
os direitos conquistados pelos povos negros e tradicionais.
O
presidente da Fundação Cultural Palmares, Erivaldo Oliveira, trouxe ao
conhecimento da plateia as ações da Palmares. Mencionou a reestruturação
da representação da Fundação em Salvador; a reavaliação de convênios; a
busca pelo trabalho interdisciplinar dos Ministérios em favor da
cultura afro-brasileira; a aplicação da Lei 10.639/03, que versa sobre o
ensino da história e cultura afro-brasileira e africana e aprovação de
emendas.
Lúcio Vieira Lima, deputado federal
(PMDB/BA), que estava no momento, disse que “investir em cultura é
investir em educação, é investimento em um país melhor. Não existe um
povo com futuro que não preserve a sua história. Nessa fase de grande
modernismo onde o mundo avança em uma velocidade enorme na ciência e na
tecnologia, é muito importante nós termos guardado, como se fosse em uma
cápsula do tempo, nossa cultura. E nada melhor para funcionar como essa
cápsula, do que as páginas de um livro”.
Compareceram
40 representantes de terreiros, entre eles: Pai Alcides; Ilê Yá Oman de
Mãe Lídia; Ilê Axé Omi Jijarun, Terreiro do Viviadeus de Santo Amaro de
Pai Eduardo; Ilê Axé de Oxum de Mãe Lina; Ilê Axé Oju Oman Oká de Pai
Sérgio; Ogán Tonho; Ilê Axé Titolobi de Pai Elson; Ilê Axé Oman Ejo de
Mãe Romilda; Ilê Axé Obé Lalay de Pai Tbo; Egbomy Kátia Vivadeus,
Babakekere do Oju Onirê, Gerisvaldo e Terreiro Mutalambô de Pai Rogério,
Ekede Marinalva, Yá Egbe Miroca e Egbe Ekede Tina. Edgar das Neves, da
Sociedade Protetora dos Desvalidos, Edméia Reis do Museu Nacional de
Enfermagem Anna Nery.
Eleonice Sacramento, pescadora e
quilombola da Comunidade de Conceição de Salinas no Recôncavo Baiano,
durante o lançamento nos compartilhou sua percepção: “Penso que é
extremamente importante termos literatura que falem da nossa história e
do nosso povo. Existiu no passado e existe ainda hoje, uma tentativa de
apagar nossa identidade. E por isso, precisamos que nossa história seja a
cada dia reafirmada. Apesar dos pescadores e pescadoras serem guardiões
de uma tradição milenar, para a sociedade brasileira somos vistos de
uma perspectiva poética ou somos figuras mitológicas. Como se fôssemos
seres distantes, mas somos mais de um milhão de pessoas produzindo
alimentos nesse Brasil. E na Bahia, apesar de parecer que nossa presença
é muito forte, não existe um respeito a quem somos, à tradição negra.
Todo arcabouço cultural e nossa contribuição para a construção da
sociedade é negada. Existe uma invisibilidade da nossa importância. E
cada dia vemos a necessidade de falarmos da gente e para gente.”
Após as falas das autoridades e a sessão
de autógrafos a noite prosseguiu com um coquetel e foi finalizada com
uma declamação de um poema do poeta baiano, Antônio Frederico de Castro
Alves. Está previsto o lançamento dos romances vencedores do Prêmio
Oliveira Silveira em Macapá, Maceió e em São Paulo, ainda em 2016.
Veja a galeria de fotos do lançamentoFonte: Fundação PALMARES
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