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quarta-feira, 31 de outubro de 2018

MAPA DA PREFEITURA DE NATAL MOSTRA ONDE COMEÇA E ONDE TERMINA CADA BAIRRO DA CIDADE


Clique na imagem para ver o mapa

Você alguma vez já quis saber onde começa ou onde termina um bairro de Natal?
Ou se aquela parte da cidade ainda pertence a determinado bairro?
Este mapa disponibilizado no site oficial da prefeitura tira essa dúvida pra você. Clique abaixo para vê-lo (“.PDF”):
Após abrir (ou baixar) é só ampliar bastante para ver com detalhes. E se você quiser saber como surgiu o nome de algum bairro de Natal clica aqui.De nada! 😉
Fonte: CURIOZZO

5 LENDAS URBANAS DO RIO GRANDE DO NORTE

As lendas urbanas existem desde que nos conhecemos por gente. Algumas fantasiosas, outras mais plausíveis, as lendas urbanas são espalhadas boca-a-boca pela população constituindo um tipo de folclore contemporâneo.
No Brasil não é diferente e cada estado parece ter seu próprio rol de lendas urbanas. Qual criança nunca teve medo de ser pego pelo homem do saco? E do chupa-cabra, criatura que assombrou a área rural brasileira, com seu aspecto de “vampiro”? Conheça agora algumas lendas urbanas características do estado do Rio Grande do Norte.
Veja aqui algumas lendas mais contadas no Rio Grande do Norte e entenda porque algumas pessoas acreditam nelas.

1. Fantasma de Lampião no Memorial da Resistência

O Memorial celebra a resistência da cidade de Mossoró, durante o ataque de Lampião e seus cangaceiros. Reza a lenda que Lampião nunca se esqueceu desta derrota e de tempos em tempos, seu fantasma volta para assombrar o Memorial, assim como de seus companheiros. Há relatos de vultos dos fantasmas dos cangaceiros avistados rondando as imediações na madrugada.

2. A botija do Jararaca

Nessa mesma batalha de Mossoró, Jararaca, um dos cangaceiros de Lampião, fugiu em meio ao combate. Mesmo ferido nas coxas e no peito, conseguiu atravessar uma ponte de ferro e se abrigou debaixo de um pé de oiticica, planta de onde se extrai o babaçu. Lá, teria reunido toda sua riqueza em uma caixa de charutos e enterrado. Após sua morte, sua alma teria se materializado para um pobre comerciante. Reza a lenda que o homem ouviu uma voz lhe chamando e avistou Jararaca, lhe dando as orientações para desenterrar seu tesouro. Após desenterrado, o comerciante virou para Jararaca para lhe agradecer e o mesmo havia sumido.

3. O Atormentado do Cuscuz

Surge no meio da noite, na forma de uma fumaça dentro dos fogões, enquanto o cuscuz é preparado pelas donas de casa. Derrubando tudo o que está por perto, apagando os fogões, com um odor característico de palha de coqueiro queimada.
Dizem que a é a alma de um sujeito que vivia sozinho e só se alimentava de cuscuz. Certa vez, dois sujeitos drogados invadiram sua casa, o amarraram num coqueiro e atearam fogo no homem. Enquanto ele morria carbonizado, os sujeitos comiam todo o seu cuscuz. Algumas pessoas já até evitam comer cuscuz pelo jantar, só por precaução!

4. A viúva Machado

Amélia Duarte Machado era uma mulher que era casada com um rico comerciante português. Após a morte de seu marido, tomou o controle de seus negócios. Naquela época, a mulher era somente útil para servir o marido. Como não tinha filhos, começou a ser vista como suspeita pela população, fazendo uma nova lenda urbana se espalhar: que a viúva comia o fígado de crianças, sendo uma espécie de papa-figo. Muitos evitavam passar perto de sua residência. A má fama teve de ser desmentida publicamente por Amélia na imprensa. Mesmo sendo lenda urbana, considerada um monstro, Amélia foi uma importante figura na história natalense.

5. A lenda do Poço Feio

No Poço Feio, em Governador Dix-Sept Rosado, existe uma formação calcária de forma curiosa, nomeada de “baú da moça”. Reza a lenda de que em noites de lua cheia, uma bela moça se banha nas águas do Poço, atraindo homens com seu belo canto que, ao se apaixonarem pela moça, a seguem até o fundo da caverna, morrendo afogados nos túneis que existem no local.
Você está pensando em visitar o RN? Não deixe de contratar um seguro viagem Rio Grande do Norte para o caso de se assustar com o fantasma dos cangaceiros e do Lampião, já que assim você conta com socorro médico, bem como para exames do coração!
Então, você conhece algumas dessas lendas? Se conhece outras, conte para nós!
Fontes: Tok de História e Notícias Bol.
Escrito por Andreia Silveira do site SeguroViagem.org enviado por Luana Biral.
Fonte: Curiozzzo

Samba enredo da Mangueira marca encontro com a resistência

A escola de samba Estação Primeira de Mangueira desfila na Sapucaí em 2019 com um samba enredo que exalta a luta do povo brasileiro em defesa das liberdades. “Eu quero um país que não está no retrato” conta a luta de Marielle Franco, de Dandara, Luisa Mahin, da revolta dos malês em um Brasil que é feito de Lecis e Jamelões. “É na luta que a gente se encontra”, dão o recado os compositores. Hoje mais do que nunca.
Público ergue bandeira brasileira após vitória do samba “eu quero um país que não está no retrato”. Marielle Franco é uma das homenageadas no samba da estação primeira de Mangueira para 2019
Confira a letra e o clipe do samba composto por Deivid Domênico, Tomaz Miranda, Mama, Marcio Bola, Ronie Oliveira e Danilo Firmino.
Intérpretes: Wantuir e Cacá nascimento
Enredo: História para ninar gente grande
Letra
Brasil, meu nego
deixa eu te contar
a história que a história não conta
o avesso do mesmo lugar
na luta é que a gente se encontra
Brasil, meu dengo
a Mangueira chegou
com versos que o livro apagou
desde 1500
tem mais invasão do que descobrimento
tem sangue retinto pisado
atrás do herói emoldurado
mulheres, tamoios, mulatos
eu quero um país que não está no retrato
Brasil, o teu nome é Dandara
tua cara é de Cariri
não veio do céu
nem das mãos de Isabel
a liberdade é um Dragão no Mar de Aracati
Salve os caboclos de julho
quem foi de aço nos anos de chumbo
Brasil, chegou a vez
de ouvir as Marias, Mahins, Marielles, Malês
Mangueira, tira a poeira dos porões
ô, abre alas pros teus heróis de barracões
dos Brasis que se faz um país de Lecis, Jamelões
são verde- e- rosa as multidões
“Eu quero um país que não está no retrato”

ANTES DE OUVIR O ÁUDIO DESLIGUE O SOM DA RÁDIO BRASIL CULTURA NO TOPO DA PAGINA

1912 – Tropas do governo do Paraná combatem sertanejos do Contestado, região no Sul do país disputada pelo Paraná e por Santa Catarina.

No dia 1 de Novembro de 1912. A Guerra do Contestado foi um confronto armado, travado entre os atuais estados de Santa Catarina e Paraná pela disputa de uma região entre os dois estados. Na visão do historiador Bóris Fausto, ao longo da chamada Primeira República (1889 a 1930), a estrutura da sociedade brasileira se diversificou. Aconteceria um “(…) avanço da pequena propriedade produtiva do campo, a expansão da classe média urbana e a ampliação da base da sociedade. A grande novidade sob este último aspecto foi o surgimento do ‘colonato’ na área rural e sobretudo da classe operária nos centros urbanos. Os primeiros movimentos sociais da classe operária se situam na República”.
Tais situações aconteceram a partir de antecedentes importantes; os anos finais do império brasileiro seriam marcados, entre outros aspectos, pelo final da escravidão. No alvorecer republicano, por meio da Constituição de 1891, a Igreja foi separada do Estado. Esses dois fatos provocariam cortantes alterações nos padrões tradicionais que, até então, prevaleciam no chamado mundo rural. Saía de cena, no caso da Lei Áurea (1888), a ameaça de “reescravização” da população sertaneja, oferecendo, mesmo que remotamente, a possibilidade de alguma mobilidade espacial para os ex-escravos, que poderiam viver reproduzindo os modos de vida dos camponeses formalmente livres.
Segundo o entendimento da historiadora Hebe Matos, o quadro que se constituiu, a partir dessas modificações (a Lei Áurea e a separação da Igreja do Estado), ofertou um imenso “(…) potencial desorganizador (…) para a manutenção da ordem social, especialmente fora das áreas mais estruturadas de produção agroexportadora”.
Um retrato do alvorecer republicano
A Guerra do Contestado ocorreu entre 1912 e 1916, no alvorecer republicano. O novo regime, iniciado em 1889, ainda sentia os reflexos da época imperial. A partir de 1891, outra constituição entrava em vigor. Quando o conflito começou, o presidente era o general Hermes Rodrigues da Fonseca (1910/1914), que logo no início do seu governo enfrentou, entre outros problemas graves na economia e na política, a Revolta da Chibata.
Seu sucessor, Venceslau Brás Pereira Gomes (1914/1918), enviando tropas federais, combateu e derrotou os participantes da Guerra do Contestado. Também mediou um acordo de limites, assinado por Paraná e Santa Catarina em 3 de agosto de 1917. Sua administração encarou os problemas oriundos das crises europeias que desembocaram na Primeira Guerra Mundial (1914/1918).
A instabilidade política reinante nos anos 1910, quer no âmbito nacional da jovem República, quer no campo internacional, representou, possivelmente, a cereja do bolo para que o conflito fosse desencadeado. Vale destacar a necessidade de reafirmação do Exército Brasileiro (em especial), o interesse e a atuação dos “coronéis” locais, entre outros pontos que fazem parte da gama de transformações que ocorreram na chamada Primeira República do Brasil (1889/1930).
O tempo, os estudos e as investigações
Ao longo do tempo, em especial a partir da década de 1970, diversos estudos sobre o movimento do Contestado trariam à cena principal elementos que permitiriam analisar, interpretar e reinterpretar os fatos que envolveram o episódio. As pesquisas iniciais apontavam na direção de um conflito oriundo da ignorância, da miséria e do abandono da região vista como um “bolsão de pobreza” – e certamente era. Indo por esse viés, chegava-se a uma consequente desqualificação dos valores contidos no mundo rural daqueles tempos.
As novas investigações passaram a questionar: por que aquelas populações agiram daquela forma? As buscas se voltaram para o universo cultural e político em que viveram os envolvidos. Também para os seus rituais de devoção, para a formação da “irmandade cabocla e das cidades santas”, para as suas lideranças e para os desejos de viver num mundo novo. A princípio, a revolta fora classificada como “alienada”; agora os acontecimentos passaram a ser entendidos como o rebatimento das demandas dos caboclos diante da realidade política e social em que viviam.
A guerra em urdidura e tramas – Áreas vazias?
Apesar da presença daqueles que genericamente eram chamados de caboclos (categoria em que poderiam ser incluídos, além dos remanescentes nativos, mamelucos, cafusos, mulatos, negros e brancos) e que ocupavam as terras onde os fatos ocorreram (praticando uma economia de subsistência sem produção de excedentes), as áreas seriam consideradas “vazias” por parte dos governos federal e estadual. Oficialmente, aqueles habitantes não eram entendidos como “agentes ocupacionais”. Desconsiderava-se a existência de populações que ocupavam a região entre o Paraná e Santa Catarina há muito tempo.
A estrada de ferro, a madeireira e os impactos
Crédito: Wikimedia Commons
Prosseguindo neste enfoque, outro ponto passa a ser considerado: a presença do capital estrangeiro na área do Contestado e, modernamente, a questão ambiental. Afinal, empresas desmataram as florestas nativas de araucária com a concessão do governo federal.
Empresas como a Brazil Railway Company (de capital dos EUA, responsável por obras ferroviárias no país entre 1906 e 1917), entre outras ações, foram as responsáveis pela construção da estrada de ferro São Paulo-Rio Grande (ampliando as conexões via malha ferroviária). A ferrovia, concessão federal (Afonso Pena – 1906-1910), concluída em 1910, serpenteou com grandes voltas consideradas por inúmeros autores como “desnecessárias”.
O motivo era direto e a conta era simples. A companhia recebia subvenção do governo brasileiro por metro linear construído. Havia interesse financeiro em aumentar o trajeto. O resultado foi o surgimento de linhas longas, antieconômicas e de manutenção dispendiosa em excesso.
Além disso, a Brazil Railway Company recebeu, dentro de uma área de 30km (15km de cada lado dos trilhos), as terras consideradas devolutas (como se nada e nem ninguém as ocupasse). Também ganhou o direito de revender os terrenos desapropriados às margens do traçado da ferrovia. Dessa forma, o governo federal, ignorava a Lei das Terras de 1850, que estabelecia normas sobre a posse das terras brasileiras – somente por meio da compra alguém poderia tornar-se proprietário.
O caso da Southern Brazil Lumber & Colonization Company (conhecida como Lumber, de capital estadunidense) envolveria a exploração comercial madeireira e a colonização das terras da região do Contestado. A partir de 1911, essa empresa de capital estadunidense estabeleceu serrarias na área contestada entre os estados do Paraná e Santa Catarina e na região dos Campos Gerais do Paraná, na divisa com o Estado de São Paulo. A principal localizava-se em Três Barras (norte de Santa Catarina). Para a época, a maquinaria utilizada era de ponta, e trabalhadores especializados vieram dos EUA.
Objetivando ampliar a sua área de exploração, a Lumber adquiriu uma quantidade significativa de propriedades cobertas de florestas de araucárias que eram habitadas por grupos de posseiros que viviam há tempos naquelas localidades. Alguns números informam que até 60% das casas norte-americanas daqueles tempos foram erguidas com madeira de lei da região do Contestado. Não se dimensionou o quantitativo de árvores derrubadas: fala-se em torno de 6 milhões.
Estudos apontam que a presença e a associação das duas empresas, interligadas a outros fatores, conduziriam à Guerra do Contestado. Se por um lado aconteceria a atuação violenta por parte dos governos federal e estadual contra os caboclos, a mesma atuação violenta seria praticada pela Lumber, olhando na dimensão ambiental que tanto preocupa os cientistas modernamente, contra as florestas nativas de araucárias. Agravando a questão ecológica, sob a copa dessas árvores, havia imbuias com mais de dez metros de circunferência.
Seguindo a linha dessa pesquisa, os impactos que tais empreendimentos causaram no dia a dia das populações locais foram significativos: pelas desapropriações das terras, pela expulsão de moradores dos locais (que os ocupavam desde sempre) ou pela alteração profunda das relações de trabalho. Agravou-se o contingente de desempregados fixados na região, após o término das obras ferroviárias. Estudos indicam que foram recrutados, no início dos trabalhos, aproximadamente 4.000 trabalhadores, número que pode ter alcançado 8.000 nos quase 400km de trilhos implantados.
Apenas um bolsão de miséria?
Diversos historiadores e geógrafos consideram o conflito a maior “guerra camponesa” ocorrida na América do Sul. Tais estudiosos, apoiados em dados oficiais da época, observam que as populações rurais da chamada região do Contestado apresentam baixos índices de qualidade de vida se comparadas com outros habitantes das demais áreas de Santa Catarina e do Paraná. Tais pesquisadores, analisando os acontecimentos, registraram a ausência de ações socioeconômicas efetivas por meio de políticas públicas que inserissem os diversos municípios, tanto por parte do governo federal, da República recentemente implantada; quanto das administrações dos dois estados. Assim, as investigações aprofundaram análises na formação socioespacial e no próprio crescimento urbano, caracterizando a região do Contestado como um “bolsão de miséria”.
Se por um lado este é um ponto que não pode ser ignorado, por outro não é o único. A guerra que matou milhares de vidas camponesas (e também das forças governamentais) e que priorizou os interesses de grupos influentes (como os grandes proprietários de terras) em nada modificou a situação reinante antes dos enfrentamentos. O acordo de partilha, homologado em 3 de agosto de 1917 no Palácio do Catete, mediado pelo governo federal entre os estados do Paraná e de Santa Catarina, também não.
A contenda, entendida como nefasta na visão dos pesquisadores Nilton Cesar Fraga e Vanessa Ludka, “(…) ceifou milhares de vidas camponesas por interesse do capital e dos coronéis de fazendas, latifundiários da época, gerando (…) um território maldito, marcado pela maldição das políticas públicas ineficientes, corruptas e de interesses de pequenos grupos que dominam a região, em todas as escalas”.
Um movimento social
A situação de discórdia entre os estados do Paraná e de Santa Catarina, envolvendo a região do Contestado, já existia. A disputa iniciada em 1900 envolvia uma área incorporada pelo Paraná postulada por Santa Catarina. Na 1ª decisão dos tribunais da capital federal o ganho de causa foi para Santa Catarina. O Paraná contestou a decisão e a região ficou embargada. Alguns historiadores usam a expressão ”terra de ninguém” ao referir-se ao local.
O movimento social deflagrado na região não tinha por objeto essa demanda. A guerra iniciada em outubro de 1912 na Região Sul do Brasil representou um conflito armado que opôs as forças dos governos federal e estadual contra as populações que viviam justamente na região do sertão disputada pelos dois estados. Vale observar que a expressão “sertão”, aqui empregada, não se refere às áreas do Nordeste brasileiro, como tradicionalmente se considera. Indica um conceito mais amplo, registrado pelo historiador Ilmar Rohloff de Mattos: “A colonização foi, antes de tudo, a aventura da conquista e ocupação do sertão. Para os colonizadores portugueses, as terras americanas significavam um imenso vazio a ser preenchido com seus interesses, concepções e valores. Um grande deserto, um desertão como as representavam. Daí a origem do nome sertão”. Segundo a historiadora Janaína Amado, “no Brasil colonial, sertão (…) designou quaisquer espaços amplos, longínquos, desconhecidos, desabitados ou pouco habitados”.
“Fanáticos” ou “pessoas normais”?
Crédito: Museu Paranaense
A imprensa daquela época, emitindo opiniões, deu cobertura aos fatos que envolveram o conflito. Os anos de hostilidades resultariam em milhares de mortes: pela guerra, pelas epidemias ou pela fome. Jornalistas, médicos, militares e cronistas podiam descrever o acontecimento como “guerra santa, guerra dos fanáticos, guerra dos jagunços, guerra sertaneja, movimento do contestado”. Dessa maneira, os letrados e as camadas médias das capitais desqualificavam os sertanejos. Mesmo aqueles que procuraram entender as razões dos rebeldes apenas conseguiam enxergar ignorância e abandono. Constituiu-se, então, uma barreira cultural impedindo que pesquisadores pudessem entender a vida, a cultura e as ações das populações interioranas, segundo observa o historiador Paulo Pinheiro.
Os estudos históricos, baseados na linha tradicional de pesquisa, atribuíram a origem e a longevidade do conflito à “ignorância” e ao “fanatismo” dos sertanejos que viviam na região disputada por dois estados e que se reuniram em torno do “monge” José Maria para resistirem à “modernização” em curso. A expressão “fanatismo” foi empregada não só para o movimento do Contestado, mas para outros movimentos sociais originados nas áreas rurais, como Canudos (1896/1897) ou aqueles ligados ao Padre Cícero Romão Batista (1872 e 1924).
Estudos a partir da obra Os Errantes do Novo Século (1974), do antropólogo Duglas Teixeira Monteiro, alteraram a forma de perceber o conflito do Contestado. Para o estudioso, os participantes do movimento sertanejo eram “pessoas normais”. Por meio dessa percepção, afastava-se qualquer noção de loucura ou irracionalidade. Monteiro destaca, entre outros pontos, os aspectos culturais da população, seus desencantos com o mundo dominado pelos “coronéis”, com o desemprego e com a consequente marginalização social após o término das obras da ferrovia.
Inicia-se outra linha de pesquisa sobre os movimentos sociais rurais como o que aconteceu na região do Contestado. Os olhares que enxergavam o mundo rural como sendo apenas um espaço de carência e de miséria, sem dar relevância alguma à cultura, à vida e aos sonhos dos sertanejos, são deixados de lado. A partir dessa nova concepção, especialistas procuram apurar a realidade em que viveram os envolvidos. Assim, por meio dos traços culturais, das experiências políticas e da tradição local, que deram sustentação à invenção do projeto da “Monarquia Cabocla”, os investigadores concluíram que não era pretendida a restauração da dinastia dos Bragança. Almejava-se a construção de um regime particular de justiça e bem-estar.
Região do Contestado – Localização e povoamento
A região chamada de Contestado era composta por terras de mata densa, com invernos muito frios, e ocupava uma área em torno de aproximadamente 48.000 km². Dados falam em 47.880 km². A área, no alvorecer do século XX, ainda não estava oficialmente demarcada. Era limitada ao norte pelos rios Iguaçu e Negro; a oeste pelos rios Pipiriguassu ou Peperiguaçú e Santo Antonio; ao sul pelo Uruguai; e, a leste, pelos limites provisórios que se estabeleceram entre Paraná e Santa Catarina.
As disputas pela região remontam aos tempos dos bandeirantes paulistas que se aventuravam naqueles sertões, pelos idos do século XVII, caçando índios para serem escravizados. Era uma área com riquezas naturais: erva-mate e, sobretudo, madeira. No decorrer do século XVIII, foi aberto o chamado “caminho do Sul”, interligando o Rio Grande do Sul à cidade paulista de Sorocaba, onde ocorriam concorridas feiras de gado.
Nos pontos de paradas dos tropeiros, surgiram arraiais e vilas; O povoamento cresceu. Aqueles que ali se fixaram construíram moradias, criando gado solto no pasto. A ausência de cercas traduzia o número reduzido de cabeças que podiam ser identificadas, sem dificuldades, por seus proprietários. A partir de meados do século XIX, os sulistas, especialmente, movimentaram-se na direção da região do Contestado; muitos fugiam da violência imposta pela Guerra dos Farrapos (1835/1845) ou pela Revolução Federalista (1893/1895).
As disputas pelas terras acabaram acontecendo entre aqueles que se transferiram para a área. Situação agravada pelos problemas de convivência com os índios locais Kaingang e Xocleng. No alvorecer do século XX, o espaço estava sob o controle dos poderosos “coronéis”. Eram os grandes proprietários de terras que estabeleceram uma rede de agregados e peões (apadrinhamento) que, além de empregados das grandes propriedades, podiam compor uma força militar.
Os “coronéis”
A instalação da República consolidou no Paraná e em Santa Catarina, como em outros estados brasileiros, o poder local conduzido pelos grandes proprietários de terras que, incontáveis vezes, controlavam a ordem pública. Tal predomínio, contando com o apoio dos governos federal e estadual, cresceu quando se associou às grandes empresas (estrangeiras) responsáveis por projetos ligados, por exemplo, à construção de estradas de ferro e à extração de madeira. Historiadores registram que o maior motivo do trauma ocorrido naquela região foi a construção da ferrovia São Paulo-Rio Grande. As populações tiveram que sair das terras imediatamente, sem prazo algum e sem indenização. Além dessa situação, as notícias que corriam não eram as melhores: se não desocupassem as terras, rapidamente, seriam mortos.
Os municípios da região, de modo geral, viviam sob o controle do “chefe local”, proprietário de terras, chamado de “coronel”. Figura poderosa, temida e respeitada devido à intrincada rede de apadrinhamento (compadrio e afilhadagem) que se desdobrava em comprometimentos de toda sorte. A troca de favores predominava nas relações políticas mantida com as autoridades governamentais. Os pedidos dos “coronéis” eram atendidos. Em contrapartida, a eleição dos candidatos da situação era garantida: votava-se em quem o “coronel” indicava, por medo, por respeito ou mesmo por interesse. Volta e meia, no emaranhado sistema de poder, avultava uma disputa entre as forças dominantes abrangendo famílias influentes.
O sistema hierárquico que envolvia riqueza e dominação era bastante rígido. Dele faziam parte pequenos criadores de gado, pequenos proprietários e posseiros (vivendo da produção das suas roças de subsistência), e estrangeiros (colonos alemães, poloneses e italianos). Mais adiante, a população do Contestado seria acrescida por desempregados vindos de vários pontos do país, atingidos pelo término das obras da ferrovia São Paulo- Rio Grande.
O messianismo e o “desencanto do mundo”
No Brasil, pelos finais do século XIX, cresceriam movimentos ditos “messiânicos”, especialmente nas áreas sertanejas mais afastadas das cidades litorâneas. Pesquisadores do assunto observam, entretanto, que o conceito de messianismo é geralmente impreciso, permitindo inúmeras interpretações. Serve mais para colocar, segundo o historiador Paulo Pinheiro, “(…) movimentos sociais e populações inteiras ‘fora de nosso mundo’. Tal conceito, originado no próprio cristianismo, foi utilizado por séculos por muitos teólogos e estudiosos da história da Igreja Católica”.
O antropólogo Duglas Monteiro traz outra abordagem ao tema, quando desconsidera as noções tradicionais de patologia ou de anormalidade para os que eram vistos como “messias”. Entende que, mesmo após a dispersão do grupo reunido pelo “monge” José Maria, a crença na sua ressurreição se espalhou, conseguindo, inclusive, a adesão de alguns fazendeiros poderosos. Indivíduos possivelmente interessados em ampliar seu domínio ou, quem sabe, até mesmo acreditando nas pregações do “santo homem”.
Essa manifestação de natureza profética pode repercutir como um absurdo para uma parcela da sociedade que se identifica com ideias racionais. Porém, para o crente, o mundo recebe ordenamento divino. Uma profecia é sustentada por meio da fé interligada à confiança em Deus. E tal entendimento não significaria uma fuga da realidade. O momento histórico e social, vivido pelas populações da região do Contestado, ditaria as necessidades e os desejos dos membros da “sociedade cabocla”, expressos na pregação religiosa dos “monges”.
Mas não se trata de abordar acontecimentos abruptos. Situações aconteceram fornecendo coerência e sentido aos fatos. A partir das décadas finais do século XIX e das primeiras republicanas, um conjunto de modificações significativas ocorreram. Entre elas, a quebra de hierarquias tradicionais, as frequentes guerras violentas com todos os seus horrores e desdobramentos (Guerra do Paraguai – 1864/1870; Revolução Federalista – 1893/1895; Revoltas da Armada – 1891 e 1892; Canudos – 1896/1897; e Chibata – 1910). Tudo isso integra o que o historiador Paulo Pinheiro chama de “desencantamento do mundo”: posição que explica a crença messiânica do movimento do Contestado. Entende que não há “(…) como negar a presença de aspectos messiânicos e milenares no movimento do Contestado, mas esses conceitos não são suficientes para entender o universo cultural e político dos rebeldes, sua recusa das instituições republicanas e do coronelismo, sua luta por terras e a construção de um novo mundo”.
Os personagens – O “monge” João Maria e o curandeiro das ervas José Maria
Crédito: Revista de História da Biblioteca Nacional
A participação de indivíduos autodenominados “monges” é importante para entender o conflito. Pouco se sabe sobre o primeiro deles, João Maria, que ganhou notoriedade atendendo doentes. Correntes históricas chegam a apontar mais de um. Sua fama fez com que inúmeros beatos adotassem o mesmo nome.
Sobre sua morte, não existem informações precisas. A historiadora Hebe Matos informa que, possivelmente, teria ocorrido entre 1904 e 1908. João Maria teria lutado do lado da Revolução Federalista de 1893 – conflito de caráter político, ocorrido no Rio Grande do Sul entre os anos de 1893 e 1895, que desencadeou uma revolta armada. O conflito alcançou os estados do Paraná e de Santa Catarina.
Historiadores paranaenses falam em três monges: João Maria, que traz a fé (uma espécie de catolicismo popular); e dois com o nome de José Maria. O primeiro (se é que existiu, pois há dúvidas) traz a política, e o segundo, seguindo as pesquisas de Hebe Matos, os prepara para a guerra.
No município catarinense de Campos Novos, na esteira dos acontecimentos, surgiu um caboclo de aspecto humilde, José Maria (1889/1912, nascido Miguel Lucena de Boaventura), que dizia ser irmão do antigo “monge” João Maria. De acordo com os estudos de Hebe Matos, pregava a fé em São Sebastião. Em torno dele, cresceram e se espalharam boatos de curas. Passou a ser visto como um homem santo que salvava vidas tratando os enfermos com ervas diversas. Numa espécie de farmácia, atendia a todos que o procuravam. Nada cobrava daqueles desprovidos de recursos. Pesquisas informam que era letrado, metódico e organizado. Para Hebe Matos, o movimento que o “monge” viria a liderar aglutinou camponeses que migravam procurando terras livres.
A “Monarquia Celeste”
Em 1912, José Maria e seus seguidores fundaram um arraial de caráter político-religioso nomeado de “Quadro Santo”, em Taquaruçu, nos campos paranaenses de Irani; justamente na região disputada pelos estados de Santa Catarina e Paraná. Consta que era um contador de histórias de feitos heroicos atribuídos ao imperador Carlos Magno, em que o bem sempre vencia o mal. Posteriormente, naquela comunidade, proclamou a “Monarquia Celeste”. Contudo, “dentro de uma perspectiva popular, a palavra monarquia não significava o desejo de reposição de situações políticas do passado”, segundo ensina a historiadora Ivone Cecília Gallo. O sentido da existência de um rei, retomando conceitos milenares, associava-se à ideia de justiça e de unidade. Uma espécie de pai de toda a população.
Como imperador, foi escolhido um fazendeiro de posses, não letrado (isso o excluía do mundo da política formal na República, desejosa de ser “moderna”), que estava entre os seus seguidores. Todos seriam irmãos, a propriedade comum e o comércio proibido, sob pena de morte (permitia-se apenas trocas). A monarquia seria administrada por José Maria, seguindo os moldes das tradições medievais. O “monge” considerava a obra História de Carlos Magno e os Doze Pares da França, bastante divulgada no interior do Brasil, como uma espécie de livro santo.
A pregação realizada pelo “santo monge” e a própria organização da comunidade associava práticas religiosas com organização militar. Registra a historiadora Hebe Matos que nos sermões atacava a República citada como “lei do diabo”. Tal comunidade, crescendo sem o controle do Estado, preocupava os dirigentes da jovem República brasileira que recentemente havia massacrado Canudos.
Ainda hoje esses fatos despertam debates e por isso são cercados de controvérsias. O universo messiânico do “monge” rapidamente recebeu leituras particulares. Inquietação por parte da elite letrada local – grandes proprietários de terras, políticos influentes e religiosos. O governo do Paraná considerou a chegada de José Maria e dos seus seguidores a Taquaruçu como uma invasão catarinense ao estado. Em meio a tantos desacertos, o “coronel” Francisco Albuquerque agiu. Possivelmente preocupado com o ajuntamento em Taquaruçu (município de Curitibanos, hoje município de Fraiburgo) e com o crescimento político daquele que fora coroado por José Maria “coronel” Henrique Almeida, enviou um telegrama ao governador de Santa Catarina narrando os acontecimentos nos sertões de Taquaruçu: “fanáticos” haviam proclamado uma monarquia naquela localidade.
Temores e medos
O telegrama repercutiu. Causou preocupação aos governos dos estados do Paraná e de Santa Catarina. Alcançando o Rio de Janeiro, capital federal, ocupou o noticiário dos jornais. O presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca, foi informado de que no Sul havia começado um movimento que objetivava restaurar a monarquia. A memória de Canudos era bem recente e atemorizava. Qualquer notícia que apontasse alguma possibilidade, mesmo apenas boato, colocava as forças militares oficiais em estado de alerta.
O início da Guerra do Contestado e a morte de José Maria:
As práticas de José Maria em Taquaruçu prosseguiam: atendia enfermos, dava conselhos, celebrava missas e batizava. Os caboclos da região passaram a acompanhar as ações do “monge”. Tidos como “fanáticos” ou “alucinados” pelas forças dominantes locais, o Regimento de Segurança do Paraná foi convocado para destruir o arraial e prender os seguidores de José Maria. Segundo depoimentos da época, consta que os sertanejos (entre 200 e 300) não desejavam o enfrentamento. Mas qualquer reunião ou ajuntamento, numa região de conflitos fronteiriços e de instabilidade social, era considerada uma atitude hostil às autoridades.
Na madrugada de 22 de outubro de 1912, as tropas governistas abriram fogo, sendo enfrentadas pelos atacados, que portavam garruchas e facões. O comandante João Gualberto Gomes de Sá Filho contava, inclusive, no seu equipamento de guerra, com uma metralhadora que acabou não funcionando. Os que foram presos tiveram as cabeças raspadas pela polícia. Em solidariedade aos presos, os seguidores do “monge” que escaparam passaram a raspar a cabeça e a se autodenominar “pelados”. Os inimigos da “Monarquia Celeste” eram nomeados então de “peludos”. A batalha de Irani é considerada como o início da Guerra do Contestado, na qual José Maria e o Coronel Gualberto faleceram em combate.
O conflito de Irani e as opiniões na época
Muito se escreveu na época sobre o conflito. Opiniões diversificadas ora a favor ora contra. Sob o olhar da Igreja Católica de Roma, José Maria era um “fanático sem limites” que colocava em risco a ação dos religiosos nas áreas rurais. O “monge” era malvisto pela população que não participava das pregações, das celebrações e nem frequentava o “Quadro Santo”. Os artigos publicados na imprensa daqueles tempos podiam descrevê-lo como “espertalhão, embusteiro, curandeiro e fraudador”. Historiadores sinalizam que a imprensa na capital federal, seguindo uma tendência daqueles tempos, dava mais destaque aos fatos que aconteciam fora do Brasil, e que tais notícias não ganhavam ênfase.
O governo, além de traduzi-lo como fanático, desejava abafar qualquer ideia monarquista, que, entendia, colocava em risco a própria existência da República. Os chefes políticos locais, algumas vezes, procuravam tirar proveito da influência do “monge”, desejando manter e até aumentar seus interesses políticos.
A ideia da “ressurreição”
Os seguidores de José Maria, acreditando nos poderes divinos do “monge”, enterraram seu corpo numa vala rasa coberta de tábuas. Imaginavam que, agindo assim, facilitariam a sua volta ao mundo. Os sertanejos remanescentes da Batalha de Irani se dispersaram pela região. Estabeleceram vários acampamentos em torno de conceitos de igualdade e de fraternidade entre os membros. Mantinham firme a crença de um novo Cristo a partir da “ressureição” de José Maria. Também reivindicavam a posse das terras que ocupavam. A ideia espalhou-se.
Em dezembro de 1913, em Taquaruçu, ressurgiria o “Quadro Santo da Monarquia Celeste”. Uma menina de 11 anos, Teodora, neta de um fazendeiro da região, começou a narrar que sonhava com José Maria. O “monge” ordenava que se reunissem, novamente, naquela localidade. Estudos indicam, apoiados em relatos de época, que o “Quadro Santo” era constituído por mulheres, crianças e idosos, sendo muitos doentes. Havia poucos negros e mulatos porque esses quase não existiam no interior do estado de Santa Catarina. Havia, também, alguns imigrantes ou descendentes de imigrantes italianos, poloneses e alemães chegados à região nos anos 1870.
Vários grupos compostos pelos crédulos, pelos descontentes e desvalidos ou pelos que estavam em desacordo com o poder exercido pelos “coronéis” foram atraídos para a localidade, desafiando as autoridades. Reunindo um contingente significativo (alguns estudos falam em aproximadamente 3000), defendiam a “Monarquia Celeste” como um reino de paz, de justiça e de prosperidade. A República era vista como um “regime do diabo” (fonte de todos os seus conflitos e sofrimentos), controlado pelos “coronéis” e por grandes empresas, como a Brazil Railway e a Lumber. Para os chefes locais, era humilhante a existência dos redutos caboclos (estudos sinalizam de 8 a 20 cidades santas), controlados por indivíduos que não eram brancos, nem cultos e nem letrados. Assim, se justificava o desejo de eliminá-los da face da terra.
É preciso pontuar que a “invenção cabocla”, agora novamente reunida em Taquaruçu, dava um novo sentido ao que eles chamavam de “Monarquia Celeste”. Não era, como já sinalizamos, um regime saudosista de restauração dos Bragança, mas uma entendida “Lei do Céu”, um regime político que abria o caminho para a afirmação de diferentes chefias sertanejas. Negava a República vigente, dominada pelos “coronéis” e por grandes proprietários. Continha uma ideia, atribuída a João Maria, que reflete, no mínimo, um projeto de aglutinação: “Quem tem, mói. Quem não tem, mói também e no fim todos ficam iguais”.
Os confrontos – O final do conflito
Crédito: Museu Paranaense
Longas e sangrentas batalhas mobilizaram tropas desde os últimos dias de dezembro de 1913 até as derradeiras prisões ocorridas em outubro de 1916 (fontes indicam números diferenciados: algumas falam em 8 e outras em 12 expedições de tropas governamentais). O Exército Brasileiro alugou quatro aviões italianos para o reconhecimento do local. O Brasil ainda não contava com aeronaves. O Ministério da Aeronáutica seria instituído apenas em 20 de janeiro de 1941. Pistas de pouso foram adaptadas nas cidades catarinenses de Caçador e Porto União da Vitória. Contudo, apenas duas seriam utilizadas efetivamente. Devido às condições meteorológicas difíceis, uma caiu em solo; outra não funcionou corretamente.
As lutas ficaram renhidas com a chegada das tropas comandadas pelo general Setembrino de Carvalho. Os caboclos conheciam bastante a região: escondiam-se e atacavam de surpresa, compensando a diferença quanto aos armamentos. Observando a tática, o comandante cercou os grupos com tropas por todos os lados, bloqueando qualquer possibilidade de entrada ou de saída – de pessoas, víveres ou armamentos. As disputas entre os seguidores de José Maria e as forças policiais e militares foram longas e sangrentas. Nessa fase do conflito, surgiu a figura de Deodato Manuel Ramos (Adeodato), tido como o último líder do movimento e de perfil bastante controverso. Conhecido como uma pessoa sem escrúpulos, um “bandido”, há consenso em evitar glorificá-lo como herói.
Em meados de dezembro de 1915, a derradeira região, ainda fora do controle das forças governamentais, foi devastada pelas tropas de Setembrino. Quando confirmou a derrota do reduto de Santa Maria, o general demonstrou agudamente seu desacordo ao declarar que aquele era um povo que necessitava de apoio governamental e não de repressão armada.
Adeodato, sem saída, vagou pelas matas com as tropas no seu encalço. Foragido por quase um ano, não resistiu às dificuldades e à fome, rendendo-se. Com essa prisão, encerrava-se, em outubro de 1916, a Guerra do Contestado. Documentos da época estimam a morte de mais de 10.000 pessoas. Algumas fontes, não oficiais, calculam em torno de 20.000, vítimas também das epidemias (como o tifo) e da fome. Consta que a população desvalida, cercada pelas tropas oficiais, se alimentava de cachorros, ratos e até pedaços de couro. A fase derradeira, até a rendição dos últimos sertanejos, ficaria conhecida como “açougue”, diante dos massacres e das degolas de combatentes já dominados e rendidos
Quanto à disputa entre o Paraná e Santa Catarina, um acordo seria firmado estabelecendo limites entre os dois estados, em 20 de outubro de 1916. O documento recebeu inúmeras críticas por parte dos representantes do Paraná. A decisão definitiva, mediada pelo presidente Venceslau Brás, seria homologada no Palácio do Catete, Rio de Janeiro, em 3 de agosto de 1917. Os governadores Afonso Camargo (Paraná) e Felipe Schmith (Santa Catarina) aceitaram que dos aproximadamente 48 mil km² em disputa, 20 mil km² ficariam com os paranaenses e 27 mil km² com os catarinenses. Os paranaenses “cederam” Itaiópolis, Papanduva e Canoinhas, mas recuperaram Palmas e Clevelândia. E a cidade da margem esquerda do Iguaçu, que havia sido fundada por paulistas, acabou dividida: União da Vitória ficou para o Paraná, e Porto União, para Santa Catarina.
1917 – “O ano da limpeza”
Crédito: Museu Paranaense
O ano de 1917, no plano da repercussão da Guerra do Contestado sobre o espaço agrário da região, é tido historicamente como o “ano da limpeza” das terras sob o domínio da Lumber e dos “coronéis”. Uma espécie de solução final. Com a anuência oficial, centenas de pessoas que ainda vagavam sem rumo pelo Contestado foram caçadas e executadas por tropas encarregadas da missão: o Exército Brasileiro, as forças policiais dos dois estados e milícias contratadas pelas oligarquias do planalto.
Pesquisas sinalizam que ainda hoje, quando algum arado revolve terras da região norte de Santa Catarina e no Vale do Rio do Peixe, pode encontrar ossos em quantidade expressiva. São restos mortais pertencentes aos caboclos sacrificados à época e enterrados em valas comuns. Também surgem cápsulas deflagradas e restos metálicos de fardamentos, entre outros materiais relativos aos fatos da Guerra do Contestado.
Conclusões
Interesses e poder, havia muito em jogo
Não houve em momento algum enfrentamento entre as forças militares do Paraná e de Santa Catarina. Entre os dois estados a disputa foi nos tribunais.
A guerra desencadeada pelos governos federal e estadual foi contra o caboclo que habitava a região do Contestado. Estudos recentes consideram que os caboclos demonstraram consciência quanto ao favorecimento recebido por empresas estrangeiras, ao enfrentarem a situação que lhes era imposta – desocupação das terras para a passagem da ferrovia.
Havia muito em jogo. Interesses e poder. Os estados de Santa Catarina e do Paraná travavam uma disputa territorial. Crescia no campo a concentração de gente pobre e sem lar, inclusive posseiros e colonos expulsos de suas casas para a construção da estrada de ferro. A crise alimentava a forte religiosidade popular, criando comunidades autônomas, cuja mera existência desafiava o coronelismo vigente.
O movimento do Contestado ainda hoje persiste sendo tratado por muitos de forma resumida e simplificada. Costuma ser analisado como uma espécie de repetição dos fatos que envolveram Canudos. A experiência dos sertanejos do Contestado teve uma trajetória diferente. Caminhou em oposição ao “coronelismo” vigente, à concentração das terras nas mãos de grupos poderosos, à presença de empresas estrangeiras beneficiadas por meio de concessões dos governos e na direção da construção de comunidades autônomas em relação ao Estado e ao Clero. “Coronelismo”, que disputava o controle das terras, do eleitorado, dos cargos públicos, enfim…
Tais pontos vão além das características locais ou regionais, como no caso do Contestado. São aspectos que estiveram presentes, e de alguma forma ainda estão, no Brasil e em boa parte da América Latina.
A expulsão de caboclos pobres da região englobava intenções que tratavam do branqueamento pretendido para o Brasil (de acordo com as teorias propostas por Gobineau e Chamberlain, ainda nos derradeiros anos do século XIX). Nas décadas posteriores, a política de ocupação das terras do planalto meridional por imigrantes europeus, iniciada ainda em tempos monárquicos, consolidaria o processo de branqueamento.
Reflexões
Um pesado silêncio sobre a guerra
A repressão sedimentou na região, segundo inúmeros historiadores, um pesado silêncio sobre a guerra. Os descendentes dos sertanejos que participaram das lutas no Contestado sobreviveram em situação precária, espremidos em pequenos lotes de terras ou nas periferias das cidades próximas. Boa parte da região onde aconteceram os enfrentamentos é especialmente carente. Dos municípios de mais baixo IDH, cinco se localizam na área. O movimento, considerado perigoso pelos “coronéis” e pelas autoridades, acabou liquidado em nome da lei e da ordem vigente. Segundo observa o historiador Eduardo Rizzatti Salomão, existem argumentos que apontam para o fato de que, após os massacres promovidos pelas forças de repressão, mesmo já debelada a insurreição, espalhou-se um sentimento de medo que acompanhou os sobreviventes, calando antigas crenças.
Os caboclos foram derrotados? Sim. Mas permanecem vivos enquanto prosseguirmos falando neles e sobre o mundo que sonharam viver. Apesar dos aspectos dramáticos que denotam a presença emblemática do enfrentamento de grupos no seu sentido mais violento, o desejo de um espaço diferente é possível… Mesmo que não alcançado naquele tempo.
Jeanne Abi-Ramia é professora de História e consultora da série de TV O Mochileiro do Futuro.