Dara Sant’Anna, diretora de Combate ao Racismo e Mariana Jorge, Secretaria Geral da UNE refletem sobre a urgência por democracia nos marcos do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha
As empregadas domésticas eram regidas por contratos, muitas vezes informais, em 2015, através da Lei Complementar n.º 150, isso mudou. Essas mulheres trabalhadoras, negras em sua grande maioria, passaram então a ter direitos trabalhistas. Direito à previdência social, ou seja, a aposentadoria, direitos de condições de trabalho digno, de receber hora extra, folga, salário mínimo.
Dezoito de novembro de 2015, mulheres negras de todo o Brasil se organizaram e, pela primeira vez, marcharam em Brasília, mulheres negras marcharam no centro político deste país, mulheres negras marcharam em um protesto contra o racismo e a desigualdade social e de gênero no país.
Também, em 2015, 12,8% dos negros entre 18 e 24 anos chegaram ao nível superior, segundo pesquisa pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), demonstrando ter duplicado o número de estudantes negras e negros em comparação com 2005, um ano após a implementação de ações afirmativas, como as cotas, apenas 5,5% dos jovens pretos ou pardos na classificação do IBGE e em idade universitária frequentavam uma faculdade.
Em 2016, levamos um golpe. Um golpe de caráter misógino que em pouco tempo ataca a cada trabalhadora e trabalhador, cada estudante que através das políticas de acesso e expansão das universidades fruto de muita luta daquelas que vieram antes de nós. O PL da terceirização, reforma trabalhista que busca a flexibilização das Leis Trabalhistas, uma reforma previdenciária que reduz o valor da aposentadoria para quem contribuir durante 25 a 33 anos, a aprovação da Emenda Constitucional n.º 95/2016, a qual congela os investimentos em saúde e educação no mínimo constitucional por 20 anos, um reajuste do salário mínimo abaixo da inflação.
Nesse cenário, de ataque à democracia, em que um governo ilegítimo tenta de todas as formas justificar o ataque aos poucos direitos conquistados pela classe trabalhadora no último período.
Ressalto, que em 2015, as domésticas tiveram sua profissão regulamentada e passaram a ter acesso à previdência social e direitos trabalhistas, mas em 2017, o legislativo e o governo federal debatem se o acordo entre trabalhador e patrão valha sobre a CLT. Dois anos, esses profissionais, em sua maioria mulheres negras tiveram por apenas dois anos a garantia da CLT.
Hoje, encaramos uma conjuntura difícil em toda a América Latina: o avanço de forças reacionárias, tentativas de golpe e um judiciário que não tem mais o pudor de mascarar sua seletividade. Estamos brigando para barrar as reformas trabalhista e previdenciária, para barrar o PL da terceirização, lutando por permanência estudantil em cada universidade do Brasil, seja ela pública ou privada.
Nós, que estamos nas universidades, vemos o aumento da evasão, o corte de bolsas de assistência estudantil, obras e projetos de construção de moradia e restaurantes universitários parados, endividamento de estudantes com mensalidades nas privadas. Isso fruto do desemprego, do reajuste do salário mínimo incompatível com o aumento da inflação, do aumento do custo de passagem e alimentação. Fruto de uma política que visa a manutenção de privilégios a custo do suor e sangue daquelas que estão na base do sistema capitalista.
Hoje, encaramos uma conjuntura difícil em toda a América Latina: o avanço de forças reacionárias, tentativas de golpe e um judiciário que não tem mais o pudor de mascarar sua seletividade. Neste dia vinte e cinco de julho de 2017, queremos saudar todas que vieram antes de mim, que lutaram para garantir as cotas, que lutaram por esse dia, pelo reconhecimento de nossa existência e resistência. Saudamos todas que foram e existiram para que nós pudéssemos entrar nas universidades, nas pós graduações, sonhar em ser médicas, advogadas, professoras, engenheiras, biólogas, escritoras…
Chegou o momento que nós precisamos mais do que nunca beber de nossa ancestralidade, das experiências, dos livros escritos e da oralidade, para lidar com a batalha que se iniciou. O próximo período será árduo, diferente da luta que enfrentamos nos anos de governo do PT – de aumento de direitos, de denúncia e exposição do racismo e extermínio da população negra, aumento de acesso a bens, aumento de negras nas universidades e pós graduações – lutas positivas, estamos lutando, também, pela manutenção de todos os direitos conquistados. Estaremos nas ruas para dizer que queremos preservado nosso direito de voto, que esse governo ilegítimo e denunciaremos todas as tentativas de retirada de direitos.
*Dara Sant’Anna é diretora de Combate ao Racismo e Mariana Jorge, Secretaria Geral da UNE.