No começo de julho, a temporada de lançamentos nos cinemas do
Brasil foi marcada pela a estreia de “Homem Aranha de volta ao lar”, “Meu
Malvado Favorito 3”, “Mulher Maravilha” e “A múmia”. Somados, estes quatro
títulos ocupam quase 75% das salas de cinema.
Por Vandré
Fernandes*
Independente
da qualidade dos filmes, o que chama a atenção é a força do lançamento. Quase ¼
das salas estão ocupadas pela a história do jovem aracnídeo. Como disputar a
venda de ingresso se as estreias brasileiras ganham apenas um horário em alguma
sala e muitas vezes fora do horário nobre? Para o cinema brasileiro alcançar
voos mais altos não só basta vontade, é preciso decisão política de mudar o
status-quo.
Foi tentando
resolver tal distorção que a Ancine, no período em que o Brasil gozava de
auto-estima, distribuição de renda e desenvolvimento, elaborou um projeto para
ampliar o número de salas de cinema para dar vazão à nossa produção
cinematográfica. Já que, em tese, quanto mais salas, mais distribuição, mais
exibição, mais democracia nas telas.
Porém, isso
não é fácil. Os grandes distribuidores e exibidores sempre deram preferência
aos blockbusters americanos. Por isso, os grandes complexos localizados nos
Shoppings nunca incluíram filmes nacionais, exceto as comédias globais, e mesmo
essas em total desequilíbrio. Ou seja, a luta da Ancine de dar alternativa de
exibição além dos grandes complexos de exibição é a mesma do pequenino Davi
contra o gigante Golias.
A recente
SPCine também fez um projeto para distribuir filmes nacionais em circuitos alternativos,
como CEU’s, Cinemas de Rua, Associações, entre outros. O motivo é sempre o
mesmo, despertar no espectador brasileiro a vontade de assistir filmes com
outra linguagem, independentes, e alimentar o (sonho) de ampliar o gosto do
público para as nossas produções.
Mas não é
fácil competir com uma indústria. Os americanos pensam num filme como calça
jeans, celular, computador… Um filme é uma mercadoria.
Se
procurarmos na história do Brasil, vamos encontrar inúmeras vezes que o governo
americano pressionou o país para inibir qualquer política que valorizava as
produções brasileiras em nossas salas de exibição. Teve até um episódio em que
um representante norte-americano disse que não mais importaria as nossas
laranjas se não aumentássemos as exibições dos filmes americanos.
Ocupação
cultural é uma forma inteligente de se colonizar um povo.
Por outro
lado, no Brasil temos uma semi-industria, que avançou muito no último período.
Nos 14 anos de governo popular, criamos uma produção robusta, mas ainda sem uma
visão estratégica de ocupação, ficando muito sobre os ombros da própria Ancine.
E o que
acontecerá agora, com um governo sem legitimidade, com um Ministério da Cultura
à deriva e uma Ancine que, nesse contexto, está fragilizadas e provavelmente
não mais vai poder atuar de forma autônoma?
Bem, como
dizia um ancora de tv: as imagens são dramáticas.
Mesmo assim,
o cinema brasileiro vive. No mesmo começo de julho estreiou – em pouquíssimas
salas – “Os pobres diabos”, de Rosemberg Cariri; “SoudTrack”, da 300 ml; “As
aventuras do pequeno Colombo”, de Rodrigo Gava. Além de outras estreias pelo
Brasil. E se tudo der certo, eles ficarão em cartaz por míseras duas semanas.
Fazendo uma conta simples, os “primos pobres das salas de cinema
no Brasil” – se for mantida a media de 20 expectadores por sessão, em uma sala,
por duas semanas – terão levado 280 pessoas aos cinemas. Já o Homem Aranha com
660 salas, 4 horários diferentes, com os mesmos números de pessoas levaria
quase 1 milhão. Se ainda contarmos com a forte publicidade para a divulgação do
filme, a política americana no cinema, e a dominação cultural que vem de quase
um século, esse número passará de 3 milhões.
Ou seja, ou a
gente toma uma atitude contra a picada do Aranha, mantendo as políticas e
projetos desenvolvidas pela Ancine ou I like American bullshit.
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