Manhã de domingo, 30 de março de 1952. A cidade de Natal estava bonita e ensolarada. Ao toque da banda de música uma multidão aplaudia cinco bravos homens que partiam rumo a Baía de Guanabara, no Rio Janeiro, e com esse feito entrariam para a história do remo potiguar e mundial.
Mas levou 20 anos para esses homens concretizassem esse sonho náutico. Em 1932, os cinco remadores dessa viagem resolveram testar o potencial de suas remadas e saíram em uma iole - embarcação esportiva a remo, num "raid" Natal-Recife. A viagem foi um sucesso, mas isso era só o começo.
O líder desta empreitada era Ricardo Severiano da Cruz, veterano do remo, poeta e funcionário público natural de Rio do Fogo (RN), que junto com amigos sentados na praia, em um encontro comum, tiveram a ideia do que ficou conhecido como o "Raid Natal-Rio de Janeiro". A conversa se espalhou pela cidade e conquistou o apoio e admiração de muitos. Aí a coisa ficou séria, mas em 1937 já estava tudo pronto para a aventura começar.
Primeira tentativa
Para aguentar as tormentas que poderiam encontrar, Oscar Simões Filho, amigo do grupo, construiu uma iole a quatro remos, de bordas mais altas e totalmente reforçada. A iole foi batizada de "Rio Grande do Norte" (na foto). No entanto, não tiveram a liberação do Ministério da Marinha para realizar a viagem. E as justificativas eram várias, inclusive que era uma loucura, o que hoje continuaria sendo, né?
Em 1952, o vice-presidente Café Filho, que era amigo dos aventureiros, conseguiu a autorização para que o raid desafiador fosse realizado. Dezesseis anos depois de tudo ter começado, quando todos achavam que a ideia tinha "naufragado" e que já não se tinha mais idade para realizá-la, ela ressurge com força total.
Da rampa do Sport Club Natal, às margens do Rio Potengi, partiram os cinco bravos tripulantes. A guarnição era formada por Ricardo da Cruz (63 anos), patrão; Antônio de Souza Dantas (49), voga; Clodoaldo Bakker (59), sota-voga; Francisco de Paula Madureira (44), sota-proa; e Oscar Simões Filho (39), proa.
Sem nenhuma tecnologia, os remadores revezavam suas posições noite e dia, mar afora. Em uma navegação costeira, beirando o litoral do país até o seu destino, tendo como referência as belas praias da costa brasileira.
No percurso, em cada parada feita nas enseadas, os destemidos heróis eram recebidos com festas. Mas nem tudo foi alegria. Enfrentando mar revolto, o sol bem quente e as chuvas torrenciais, os homens chegaram a passar trinta horas sem pisar em terra firme. Muitos chegaram a pensar que eles não iriam resistir ao mar.
Em 2 de junho, com o tempo em boas condições, o grupo chegou à barra de arrebentação, e uma onda violenta os atingiu partindo a iole ao meio. Com muita sorte, apesar das adversidades, os cinco se salvaram, nadando de volta para costa a aproximadamente 11km. Retornaram a Natal em uma corveta da Marinha de Guerra.
Segunda tentativa
Mesmo com receios eles não desistiram de retomar a aventura. Receberam então o apoio e a colaboração do povo e de autoridades, conseguiram construir uma nova embarcação, feita pelo mestre naval Luís Enéas, na oficina da Base Naval. E em 18 de dezembro, a iole Rio Grande do Norte II estava pronta para ir ao mar.
Porém dois dos náufragos da primeira embarcação desistiram de continuar a jornada: Francisco de Paula Madureira e Clodoaldo Bekker. Foram substituídos por Luís Enéas e Walter Fernandes (dono da água mineral Santos Reis), este último era o tripulante mais jovem da iole, 27 anos.
Os remadores e a nova embarcação saíram de Natal para concluir a epopeia em 18 de janeiro de 1953, a bordo do caça-minas ‘Piranha’, com destino ao ponto em que haviam parado. Chegando novamente à costa sergipana em 08 de fevereiro, foram para Mangue Seco e de lá retomaram a aventura.
Sucesso!
A consagração do sonho foi em 21 de maio de 1953, com a chegada tão esperada e festejada na Baía de Guanabara. Após uma jornada de quase 100 dias de viagem, foram recebidos com todas as honras merecidas. Barcos da Marinha, remadores nacionais e internacionais, várias autoridades e um grande público que estava à espera dos “heróis do remo”, como ficaram conhecidos.
Foram recebidos pelo vice-presidente Café Filho, onde foram prestadas várias homenagens, inclusive dos clubes de regatas locais. Retornaram à capital potiguar e foram recebidos com toda pompa. A BBC de Londres noticiou o fato como o maior feito náutico do mundo.
No entanto, as expectativas do feito não se superaram. Mesmo com toda glória da viagem difícil e perseverante, os remadores esperavam um reconhecimento financeiro, mas ele não veio. Com o passar dos anos, a epopeia praticamente caiu no esquecimento, assim como o esporte náutico caiu em declínio.
Com informações de Robvani Gomes em "Fernando Amaral FC" e do livro "Dos Bondes ao Hippie Drive In" de Carlos e Fred Rossiter Pinheiro.
Fonte: Curiozzzo
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