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sexta-feira, 30 de março de 2018

Duas semanas da morte de Marielle e o que temos até agora é o mesmo de quando um negro é morto na favela

Marielle Franco. Foto: Wikimedia Commons
POR ÉRICO BRÁS, ator e conselheiro do Fundo de População das Nações Unidas, agência da ONU especializada em temas de demografia, juventude e saúde sexual e reprodutiva
Já se passaram duas semanas desde o assassinato da deputada Marielle Franco e do motorista Anderson Pedro Gomes e até agora a polícia emitiu um parecer oficial sobre a investigação. No dia 26 de maio, Especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU) ligados a questões de direitos humanos e de gênero, fizeram um comunicado pedindo investigação rápida e imparcial dos crimes. “O assassinato de Marielle é alarmante, já que ele tem o objetivo de intimidar todos aqueles que lutam por direitos humanos e pelo Estado de direito no Brasil”, disseram os relatores.
Quem se lembra de ter visto no país tamanha comoção pela morte de uma mulher negra favelada? Certamente os executores e mandantes do assassinato não esperavam tamanha repercussão na mídia e reação da sociedade. Mas, com a demora na investigação e o silêncio da polícia, aos poucos a rotina esmagadora vai tirando a notícia da primeira página dos jornais, naturalizando algo que jamais deveria ser aceito.
Crimes contras pretos, pobres e favelados costumam mesmo passar despercebidos. Para mais da metade da população brasileira, a morte violenta de um jovem negro choca menos do que a de um jovem branco, segundo pesquisa realizada pela Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e pelo Senado Federal.
Marielle morreu porque defendia os pobres negros e favelados. Os mesmos que entram no estereótipo de quando se define quem é bandido. Os mesmos que lotam as cadeias e são mortos nas ruas todo dia. Nascer negro e pobre no Brasil é quase sentença de morte: 77% dos jovens que morrem no país são negros que vivem em comunidades.
Dos 10% dos indivíduos com mais chances de serem vítimas de homicídios a maioria (78,9%) é negra. De cada mil adolescentes brasileiros, quatro serão assassinados antes de completar 19 anos.
Se o cenário não mudar, 43 mil brasileiros entre os 12 e os 18 anos serão mortos de 2015 a 2021, três vezes mais negros do que brancos, segundo dados do Fundo das Nações Unidas (Unicef). Todos os anos são assassinadas no país 30 mil pessoas, 23 mil são jovens negros. A cada 23 minutos, um jovem negro morre no país. São números de guerra. São números de um genocídio.
O Negro quando não morre é preso. Quando não é preso, é sentenciado pelo descaso. No Brasil a polícia costuma escolher os suspeitos a partir de uma filtragem racial, com base exclusivamente na cor da pele. Não por acaso 85% dos homens presos são negros.
A relação entre o recorte racial e a violência no Brasil atinge também o sexo feminino. Enquanto a mortalidade de não-negras caiu 7,4% entre 2005 e 2015, entre as mulheres negras o índice subiu 22%. Preconceitos aumentam a discriminação racial, fazendo com que os negros sejam as principais vítimas.
Esses números só serão revertidos quando estado e sociedade se comprometerem com o fim do racismo. Mais do que intervenção policial, é preciso trabalhar por programas sociais, por educação pública de qualidade, por políticas de integração. É preciso incluir jovens negros na agenda do desenvolvimento sustentável. Isso tem a ver diretamente com o futuro do Brasil. Afinal, que futuro queremos para o país se estamos matando jovens e enchendo as cadeias de homens negros?
Fonte: DIÁRIO DO CENTRO DO MUNDO - DCM

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