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quarta-feira, 27 de maio de 2020

UMA HORA DE ORVALHO (miniconto) - Por IARA MARIA CARVALHO

Iara Maria Carvalho
Português Compartilhado: Atividade de português - miniconto ...
Por Iara Maria Carvalho - Currais Novos-RN

Miranda soube que tinha chegado sua grande hora no momento em que acordou. De dentro da bolha, ela podia sentir uma espessura diferenciada nos raios de sol. Havia se preparado para isso durante tempos, um tempo há muito inominável, impossível de quantificar. Era ela entre bilhões de Mirandas mirando essa hora, a grande hora, já cantada - nas antigas - por poetas.

Acordou com uma energia inqualificável, talvez nunca sentida nem mesmo nos tempos ditos normais. Limpou seus arredores, desmarcou as páginas do livro sagrado, penteou os cabelos: queria começar do zero, depois da grande hora. Depois do pêndulo finalmente móvel, invocando uma sensação única de antes da bolha, antes do caos, antes do nada.
Quando, finalmente, soaram as cinco horas da manhã do dia de Miranda, da hora de Miranda, daquela entre bilhões de Mirandas mirando sua própria hora, Miranda vestiu sua roupa de festa com o tecido da melhor linhagem, perfeito para máscaras e mandriões; impossível de conter o abismo de todas as miragens daquele instante que estava por vir.

Miranda saiu às ruas de fora da bolha: estranho pisar nos paralelepípedos – ela nem sabia mais pronunciar essa palavra plurissilábica. As palavras nos domínios da bolha têm uma esterilidade obscena: medo de dizê-las com toda sua carga de mistérios; receio de tocá-las em sua inútil beleza.

Sentia as pedras sob os pés, ela ainda sentia, a sensibilidade perplexa. Os chinelos pouquíssimo sólidos ajudavam Miranda no avanço diante do misterioso amanhã. Ela pensou que música deveria estar tocando nessa hora, mas não lembrava mais de nada. Um silêncio cortou as nuvens e pássaros voaram plenos, finalmente donos do céu puro e amplo.

Quando, enfim, chegava no alto da ladeira mais súbita, seu chinelo se rompeu. Miranda parou no tempo. Um tempo recém-nascido é frágil demais. Não conseguiu continuar, o receio de pôr os pés no chão e seguir, foi maior.

A sua hora já estava perto do fim e Miranda teve que voltar. A hora do orvalho de Miranda voltará em outras eras, depois que todas as outras Mirandas mirarem seu próprio sol por sessenta minutos bem contados. Talvez nessa hora que virá, Miranda não tenha medo de voar.

Iara Maria Carvalho - Agente de Cultura de Currais Novos - Rio Grande do Norte - BRASIL

"Parabéns, Iara Carvalho pelo belíssimo CONTO! Ficamos felizes por termos grandes poetas/poetizas e contadores como você! Abraço!" - Eduardo Vasconcelos, presidente do Centro Potiguar de Cultura - CPC/RN e Agente de Cultura de Nova Cruz/RN.

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