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quinta-feira, 22 de julho de 2021

Sobre os índios que levei para a escola

Ana Paula Campos

Semana passada li a crônica do indígena tapuia, intelectual e colunista do Jornal Potiguar Notícias, Fábio de Oliveira, e fiquei completamente desestruturada. Passei a semana pensando nas suas palavras e refletindo sobre a minha prática como professora. Seu texto falava sobre a situação dos indígenas Warao, segundo maior grupo étnico da Venezuela e sua atual situação. Fábio expunha nossa cegueira racial ao relatar as violências enfrentadas por esse povo e nossa inércia diante deles nos sinais de trânsito de Natal. 

Senti vergonha de mim. Precisei me recolher uns dias para pensar e aceitar o óbvio: eu passei anos e anos levando uma narrativa completamente equivocada e esvaziada de sentido para a minha sala de aula sobre os indígenas. Eu tinha boa intenção e realmente queria fazer uma homenagem aos povos originários, mas o que eu fiz, na verdade, foi reforçar uma estrutura racista de exploração. 
 
Quem me acompanha nesta coluna já sabe que costumo ser muito honesta nas minhas falas. Acredito que precisamos ultrapassar o nível da vergonha de reconhecer nossa prática medíocre e estudar para ir além, afinal de contas, são vidas que estão em jogo. Não dá para sermos levianes com isso. Reconhecer meus erros pode despertar em outres educadores o desejo semelhante de mudança. Sigamos. 
 
Enquanto uma barragem obstruía o rio Manamo na Venezuela, provocando enchentes e destruindo os recursos naturais e fontes de vida para os Warao, eu falava nas aulas em índios de forma generalizada, sem especificar as diversas étnicas e as diversidades de tantos povos. Eu reforçava a lógica do colonizador em desconsiderar a pluriversalidade ao reduzi-los a um pacote homogêneo: apenas índios. 
 
Um surto de cólera levava a óbito cerca de 500 indígenas Warao na década de 90, mas eu estava presa em um looping temporal no passado. Os índios das minhas histórias tinham ficado para trás. Estavam presos no contexto colonial, tinham sofrido um breve período de escravidão e fim. Foram essas inverdades que reproduzi por anos. Além disso, eu não reconhecia nem discutia a existência de indígenas urbanos. Eu não os via ao meu redor, e por esta razão, seus problemas não me diziam respeito. 
 
O etnocídio e o ecocídio seguiam seu curso em velocidade acelerada com as políticas de Nicolás Maduro entre 2014 e 2016, e eu estava em outra parte da América fazendo o mesmo, apresentando índios que usavam tanga, nadavam no rio, usavam arco e flecha para caçar e viviam em paz com a natureza. O tempo verbal sempre no passado. Eu desconhecia totalmente a realidade violenta pela qual todes estavam passando naquele momento. 
 
Eu acreditei no discurso de um branco burguês. Se Câmara Cascudo afirmou que não havia mais indígenas no Brasil, por que eu perderia tempo pesquisando? Elxs estavam o tempo todo ali, ao meu lado. Nas escolas, universidades, nas ruas, nos sinais de trânsito. Mas a minha cegueira racial não me permitia vê-lxs.
 
Resolvi fazer algo útil da minha vergonha. Pedi ajuda a quem entende. Fábio me indicou vários sites confiáveis para pesquisa. Eu já vinha estudando filósofes como Ailton Krenak, Eliana Potiguara e Davi Kopenawa, e lendo as crônicas semanais deste colunista de etnia Tapuia. Mas ainda não tinha parado para pensar nas questões que estão acontecendo agora ao meu redor e como tudo isso poderia estar presente nos meus planos de aula. 
 
Que eu conheça a diversidade. Que eu leia filosofia indígena, mas que no fim, eu saiba fazer a transposição didática de tudo isso para crianças do Fundamental. A educação é o caminho, mas descolonizar a mente e tirar o véu do racismo é essencial. Obrigada, Fábio de Oliveira, por tanto. 
 
Obs: As informações sobre os Warao têm como referência a crônica de Fábio de Oliveira. Para leitura, segue o link: 
https://www.potiguarnoticias.com.br/colunas/post/4169/Histrias-para-alm-do-que-se-v

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